M&M Marrom

 

(Por: Mariano Andrade)


"I see the power changin' hands / Risin' from the streets / A self-made businessman / Knows how the system can be beat

Oh, we're the lost generation / Have no place to go / The road to destruction / Is all we need to know

'Cause it's a rip-off / We're stepped on and cheated / We're flat stone cold lied to /
We're not defeated, no"

(Van Halen, “The Dream Is Over”)

 

O saudoso Eddie Van Halen foi um dos maiores inovadores do rock. O grupo Van Halen foi o veículo perfeito para Eddie introduzir elementos incríveis em diversas canções. Desde popularizar o “tapping” na guitarra em “Eruption”, até vinhetas em estilo flamenco com “Spanish Fly”, Eddie também nos presenteou com lindos “volume swells” em “Cathedral”, fazendo sua guitarra soar como um órgão de igreja. Eddie criou harmônicos que nem a guitarra sabia serem possíveis de executar em “Mean Street” e “Panama”, além de tocar com uma furadeira em “Poundcake” e explorar escalas simétricas em diversas passagens. Seus solos em “Jump” e “Right Now” são absolutamente memoráveis. Se restava alguma dúvida sobre a genialidade de Eddie Van Halen, o hit “Beat it” de Michael Jackson tratou de encerrar o tema (detalhe: o solo de “Beat it”, um dos mais icônicos de todos os tempos, foi gravado em apenas 2 ou 3 takes e foi improvisado!).

Além das inovações musicais, a banda Van Halen era conhecida por exigir que em seus camarins a organização do show colocasse uma champanheira cheia de M&Ms. Mas havia um detalhe curioso: os M&M marrons deveriam ser removidos um a um. O objetivo desta cláusula contratual era criar uma deixa visual para a equipe da banda observar se a organização do show havia prestado atenção às demais demandas contratuais. Se houvesse M&Ms marrons, a banda simplesmente cancelava a apresentação.

O Van Halen colocava equipamentos bem mais pesados do que as outras bandas de rock sobre o palco. Além de a estrutura ter que ser capaz de suportar o peso das paredes de amplificadores, também deveria haver cuidados especiais com a instalação elétrica para evitar choques e incêndios. Isso sem falar nos fogos de artifício. Como era muito difícil auditar toda a montagem e o enquadramento dos parâmetros de segurança, os M&Ms marrons funcionavam como o canário na mina de carvão.

 

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A eleição para a prefeitura de São Paulo é o evento político mais importante do ano no Brasil. Nela, abundam M’s:

            M&M Marrom

            Muito Medo

            Marçal

            Marçal, M&M Marrom, Muito Medo

Parênteses: Ainda há o “M” de Marina. Não se trata da ausente pseudo-defensora da floresta, mas sim Marina Helena, do Novo. É uma excelente candidata, mas com o fardo de estar num partido cuja franquia foi desintegrada pelo lamentável João Amoêdo.

Todos os políticos profissionais têm medo de uma eventual vitória de Pablo Marçal. O motivo é muito simples: trata-se de um sujeito bem-sucedido na vida privada e um verdadeiro outsider na política. O medo, na verdade, não é sobre Marçal vencer o pleito, mas sim de ele realizar um governo excelente e muito superior a qualquer outro já vivido na cidade.

O objetivo aqui não é endossar Marçal. Ele perde a linha em alguns debates? Sim. Ele fez acusações ainda sem provas? Sim. Ele por muitas vezes foge ao tema suscitado nos debates? Sim. Pairam dúvidas sobre sua trajetória, suas associações e sobre como enriqueceu? Sim. Mas, ainda assim, Marçal é o M&M marrom.

A presença de um M&M marrom assusta os políticos. E aqui incluem-se políticos de direita, esquerda, centro, extrema-o-quê-for, ou qualquer combinação dos anteriores. Vai que Marçal ganha? Vai que ele faz uma excepcional prefeitura? Vai que ele não concorre à reeleição ou tampouco deixa a prefeitura em 2 anos para tentar um outro cargo em 2026? E, vai que ele faz tudo isso com uma campanha sem dinheiro de fundo eleitoral. São muitas quebras de paradigmas – o palco da política pode desmoronar, o show pode pegar fogo e o sistema toma-lá-dá-cá pode virar cinzas e escombros.

Num país onde a política deixou de ser a “arte do possível” e virou “a arte de enojar o povo até o limite de uma revolta popular”, Marçal aparece com uma proposta-chave que é extremamente ameaçadora – ensinar ao povo como empreender. Marçal foi um dos empresários que, na tragédia do Rio Grande do Sul, tomou protagonismo em ajudar as vítimas e evidenciou a morosidade, incompetência e ineficiência dos governos e do poder público em geral. Imaginem se ele expuser essa mazela em larga escala na maior cidade do país? E imaginem se ele mostrar aos eleitores que há um caminho melhor do que depender do Estado? O risco para os políticos de carteirinha é enorme. M&M Marrom. Medo. Muito Medo.

Não por acaso, o “sistema” já tratou de cercear as redes sociais de Marçal, acatando um pedido de Tabata Amaral. Não por acaso, o partido de Tabata Amaral pediu impugnação da candidatura de Marçal (a ironia é que o partido através do qual Tabata ingressou na vida política tem um “D” de “democrático”, risível e cômico). Não por acaso, Jair Bolsonaro já arrumou uma maneira de criar atrito com Marçal – vamos combinar que Bolsonaro também é político profissional, afinal foram décadas no legislativo sem nenhuma realização de relevo. O clã Bolsonaro também sente medo, afinal os filhos do ex-presidente parecem confortáveis em se encostar em mandatos legislativos. Não por acaso, pasmem: membros do próprio partido de Marçal pediram impugnação de sua candidatura, um “fogo amigo” que revela o quão imundo e detestável é nossa política. Ricardo Nunes? Com medo. Guilherme Boulos? Com muito medo. Datena e Tábata, idem. Lula e o PT? Muito&muito&muito medo, um medo supremo.

Se uma eventual administração Marçal demonstrar que, com gestão competente é possível zerar filas de cirurgia, criar linhas de teleférico desafogando o trânsito, introduzir empreendedorismo nas escolas, dentre outras realizações que seus adversários tacham de impossíveis, teremos uma nova alvorada (com trocadilho). O brasileiro vai acordar para um fato importante: os cargos públicos deveriam ser ocupados preferencialmente por pessoas que se destacaram na vida privada e que querem contribuir para a sociedade com sua capacidade de gestão. Neste contexto, Lula, Dino, Boulos, Marina Silva, Mercadante e outras milhares de figuras são os M&Ms azuis, amarelos, verdes e (com trocadilho) vermelhos, que não servem de nada – são mais do mesmo. Marçal pode abrir caminho para outros M&M marrons, pessoas de sucesso que gostariam de contribuir na vida pública, mas que se desanimam com a champanheira ocupada e monopolizada por confeitos de outras cores.

(Nota – Há exceções, Tarcísio de Freitas é uma delas: não se pode questionar sua enorme capacidade executiva, embora seja servidor público de carreira. Mas o ponto é que a política brasileira está dominada por figuras sem qualquer qualificação ou sucesso pretérito em gerar riqueza ou bem-estar).

A vitória de Marçal pode significar um ponto de inflexão na cena política brasileira. Por mais que permaneçam muitas questões sobre sua trajetória, suas associações e suas reais intenções na política, parte do eleitorado paulistano parece disposto a tomar o risco – por isso Marçal subiu nas pesquisas. É um reflexo da falência da política brasileira e de seu clubinho decrépito, é um sintoma da descrença geral da população. Se Marçal demonstrar o óbvio na maior cidade do país e vitrine nacional – qual seja, que o principal papel do governo é “não atrapalhar” e deixar a população prosperar – quem sabe o país passe a votar melhor e tenhamos um futuro mais promissor.

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Independente de Marçal, está posto o serviço "disque M para medo". Há uma enorme demanda por renovação e, até mesmo, disrupção na política brasileira. Trata-se de uma oportunidade. Que venham muitos M&M marrons: o que não faltam no Brasil são empresários e gestores honestos e bem-sucedidos apesar dos nossos M&Ms coloridos com prazo de validade vencido atrapalharem tanto..

 

“We’ll get higher and higher, straight up we’ll climb / We’ll get higher and higher, leave it all behind.” 

(Van Halen, “Dreams”)


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