(Por: Mariano Andrade)
Cidade pobre do sertão nordestino. Dois homens simples visitam
uma igreja e são interpelados pelo padre já nas escadas que conduzem à porta.
– Bom dia. O que os
fiéis trazem nesta caixa?
– Padre, aqui neste
caixe está e lingue portuguese. Nós viemos enterrá-le ne igreje.
– Meu filho, eu sou
velho e um pouco surdo. Pode repetir?
– Sim. Eu e meu amigue
Chiqué viemos pedir ao senher padre para enterrar nosse caixe aqui ne igreje. É
e caixe onde jaz e lingue portuguese.
O padre seguia meio perdido no diálogo. Mas insistiu.
– Meus filhos, quais são
suas bençãos?
– Joãx Grilx e Chiqué,
seu padre.
– Muito prazer. Vocês
trazem aí uma língua? Língua de gente cortada?
– É mais ou menos
isse. Mas é simbólicx. É e lingue portuguese. Queremos enterrá-le aqui neste igreje
e o padre pode dar e bênçx.
– Que jeito doido de
falar é esse, meu filho?
– Padre, é unx jeitx que
elimina de lingue portuguese os machismos e sexismos. É unx jeitx que usa
pronomx neutrx e coloca o “e” ne terminaçx des palavres.
– Meu filho, você
inventou isso?
– Não, padre. Todx
mundx fala assim agora. Tem até colége que mudou o jeitx de escrever.
– Meu filho, então não precisa enterrar nada. Vocês já enterraram a língua portuguesa e, no final dessa história, serão julgados por isso.
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Esta semana, o Colégio Franco Brasileiro do Rio de Janeiro
publicou uma circular onde informa que passará a adotar a “neutralização de gênero”
na língua portuguesa. Segundo o comunicado, “a neutralização de gênero
consiste em um conjunto de operações linguísticas voltadas tanto ao
enfrentamento do machismo e do sexismo no discurso quanto à inclusão de pessoas
não identificadas com o sistema binário de gênero”.
Ariano Suassuna deve estar feliz por não ter vivido para assistir
a esse show de horrores. Sua amada língua portuguesa foi assassinada, colocada
em uma caixinha e querem enterrá-la na igreja com a bênção do padre. Nem João Grilo
conseguiria desenrolar essa situação ridícula à qual chegamos.
Um idioma é um ente vivo, não há dúvida disso. Sempre foi
assim. Ou seja, não houve um malvadão há 2000 anos que criou a língua portuguesa
dotando-a de sexismos e sectarismos. Não! A língua atual é o resultado do acúmulo
de modificações espontâneas que o idioma foi sofrendo ao longo do
tempo.
Essa idiotice de “meninx”, “prezades” e “alunx“ não tem nada
de espontânea. É carregada de agenda política e de modismos. Não merece nem uma
nota de rodapé no nosso idioma. E, do momento que a palhaçada coopta entidades que
tentam forçar sua adoção, qualquer traço de legitimidade que pudesse existir em
tais “operações linguísticas” é eliminado.
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Pergunta à direção do nobre colégio: as palavras em francês também
estão sofrendo neutralização de gênero na comunicação da escola? Seria
interessante que dessem alguns exemplos ou publicassem a tal circular na versão
francesa.
Será que agora os alunos podem escrever "j'elle ai parlé" no lugar de "je lui ai parlé", para empregar um pronome feminino "raiz"? Talvez essa seja uma das "operações linguísticas" que o colégio propõe para a língua francesa, vai saber...
Et regardez ça: a palavra vagina em francês é masculina! Será que o idioma francês é ainda mais opressor que o português? Et maintenant, Joseph?
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Esse circo linguístico só existe no Brasil. Por mais demagogos que sejam os políticos de esquerda nos EUA e Europa, e por mais que
o debate de minorias seja também imbecilizado por lá, o tema linguístico não existe
(ou, ao menos, não tem relevância). É uma jabuticaba ou, melhor, ume jabuticabe.
Ou, ainda melhor, ume merde.
É o tipo da agenda que consome tempo, debate político, impostos, paciência e que não traz qualquer benefício à sociedade.
Francamente, o sujeito que se sente ofendido por um pronome masculino ou feminino
não precisa de um novo idioma, e sim de terapia. Se por acaso alguém achar que
o sexismo da língua é uma imposição do “sistema”, por favor procure o manicômio
ou vá estudar um pouco, quem sabe ainda tem solução. Finalmente, se a reclamação
é que a biologia da nossa espécie só possui dois gêneros cromossômicos, recomenda-se
postar chamado no Reclame Aqui ou enviar e-mail para sac@deus.god .
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O Auto da Compadecida é uma das maiores obras da literatura
brasileira, uma peça genial. Embora seja pretensioso utilizá-la para abrir este
artigo, Ariano Suassuna sempre enalteceu a beleza de nossa língua. Sua ausência
é muito sentida num momento em que tentam assassinar o idioma português a céu
aberto.
Ademais, o Auto da Compadecida é narrado por um palhaço... Bem
adequado para caracterizar a turma da “neutralização”.
"Francamente, o sujeito que se sente ofendido por um pronome masculino ou feminino não precisa de um novo idioma, e sim de terapia"...sintetize tude
ReplyDeleteabrace de amigue Roche
Obrigadx
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