Amor, estranho amor

 

(Por: Mariano Andrade)


“... não te contei, né? Que meu amor não cabe num contêiner...” ("Poesia para ela", João Napoli)

 

“Amor, estranho amor” é um filme nacional de 1982. Alguns anos após o lançamento, houve enorme polêmica acerca da produção – Xuxa, que à altura alcançara o estrelato, tentou impedir a exibição do filme. O motivo: na trama, havia uma cena de sexo (simulado) entre ela e um menino de 12 anos.

Xuxa conseguiu vetar a veiculação do filme entre 1991 e 2018, mediante acordo pelo qual pagou pelos direitos autorais da obra. Mais tarde, por decisões judiciais, o filme foi definitivamente retirado de circulação, embora alguns trechos ainda possam ser encontrados online.

Mas, para a justiça brasileira, é como se o filme não tivesse existido, ele foi deletado.  

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Esta semana, o ministro Dias Toffoli proferiu decisão na qual anula todo o processo envolvendo a Odebrecht na operação lava-jato, invalidando as provas apresentadas no âmbito do acordo de leniência. Deletou, nada daquilo existiu. O “amigo do amigo do meu pai” desinventou a planilha que lhe conferia tal alcunha e tantas outras vexaminosas.

A decisão de Toffoli é uma afronta ao poder judiciário, ao ministério público e a todas as empresas e pessoas que conduzem seus afazeres com ética e probidade. Para quê? Basta ser “amigo do amigo” da pessoa “certa” que seus malfeitos (eufemismo, ok?) podem ser apagados.

Já que o poder judiciário, excetuando-se o STF, resta inútil no Brasil, fica aí uma ideia para o ministro Haddad – por que não extinguir todos os cargos do judiciário? Isso ajudaria no tão perseguido (e prejudicial, pela sua natureza arrecadatória e contracionista) déficit zero. E, no caminho, o STF pode também desintegrar o fato histórico de que Haddad foi derrotado por votos brancos e nulos, além de não ter vencido em uma única zona eleitoral quando tentou a reeleição para prefeito.

Não é coincidência que o PT esteja, neste exato momento, tentando reescrever a História. Há um movimento para devolver simbolicamente o mandato a Dilma Rousseff. Tomara que não apaguem das redes seus discursos cômicos, estes sim um legado importante do PT. E, quem sabe, Toffoli poderá apagar suas reprovações em exames para a magistratura, tema que deve lhe incomodar e que merece ser pulverizado.

Há tanto para deletar que talvez o STF não dê conta do recado – o recorde de desmatamento, o enaltecimento à Venezuela de Maduro, as falas clamando por votos secretos no STF e outras mudanças inconstitucionais. Isso tudo em apenas 9 meses. Ah, e saibam todos – Lula não gastou R$ 30 milhões em viagens internacionais só em 2023, abracadabra e ... poof! Sumiu. Ele só viajou para Atibaia e para o Guarujá (hospedando-se com amigos, claro).

O STF poderia se aconselhar com Xuxa, vai ajudar na árdua tarefa. Flávio Dino também pode contribuir, ele entende de apagar e já demonstrou competência técnica no assunto.

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A mesma justiça houdiniana que isenta Odebrecht, Sérgio Cabral e tantos outros, é a mesma que persegue o ex-presidente Bolsonaro diuturnamente. “Foi um genocida na pandemia”, embora a vacinação aqui tenha se iniciado apenas um mês depois da europeia. “Fez reunião com embaixadores”, embora fosse prerrogativa do cargo. “Atentou contra a democracia” pedindo voto impresso, o mesmo que já foi defendido por vários políticos lulistas, incluindo um atual ministro. E por aí vai. Claro: a questão das joias deve ser esclarecida, afinal de contas a lei diz que, ao final do mandato, o presidente pode levar consigo bens de cunho personalíssimo – roupas, perfumes e alimentos.

E os 11 (onze!) contêiners de presentes que Lula retirou do Planalto ao fim de seus dois mandatos? Será que só continham roupas, alimentos e perfumes? Lula, o pai dos pobres, poderia ter doado tantas roupas aos sem-teto numa cerimônia com Boulos, mas não... Lula, o magnânimo, tampouco distribuiu contêiners e contêiners de alimentos aos sem-terra... E nem com 11 contêiners de perfume seria possível mascarar o mau cheiro de tudo de ruim que o PT fez em 13 infelizes anos de governo.

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O amor venceu. Tal como na música, o amor que venceu não cabe num contêiner. Amor, estranho amor.






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