Vendaval da mudança?


(Por: Mariano Andrade)

O vendaval que destruiu a estrutura da árvore de Natal da Lagoa reacendeu animosidades de alguns cariocas. Nas redes sociais, pôde-se ver uma onda de comentários comemorando o possível cancelamento da festividade este ano, enquanto outros moradores torcem para que a árvore seja consertada a tempo do Natal.


Certamente a árvore de Natal gera movimento intenso de carros e pessoas e traz mais transtorno ao já caótico trânsito de dezembro na cidade (não que o trânsito seja bom nos demais meses...). Os moradores da Lagoa e bairros próximos têm, portanto, motivo legítimo para criticar a árvore: ela atrapalha enormemente seu ir e vir.

Por outro lado, a árvore é uma diversão gratuita, atraindo moradores de áreas mais pobres e constituindo ótimo programa familiar numa época de confraternização. Ademais, o evento movimenta bastante o comércio da orla da Lagoa (formal e informal), ocasionando receitas relevantes aos quiosques e ambulantes. O município também se beneficia, levando à rua hordas de guardas com talonários de multa sempre à mão - um exército com o mandato de reforçar o caixa e, se der, ajudar a organizar o trânsito.

Este debate - reiniciado pelo vendaval - deveria inspirar mudanças à maneira como a prefeitura organiza o evento. Hoje, de fato, a árvore da Lagoa não traz nenhum benefício duradouro à cidade, Se houvesse distribuição gratuita de pipoca, seria o perfeiro "pão e circo" - mas hoje é apenas um circo que ajuda o carioca a esquecer o quadro lamentável da economia da cidade, os impostos crescentes, a má conservação de ruas e monumentos e, principalmente, as obras que nunca terminam. Há ainda o agravante bairrista de que é uma empresa paulista que explora o cartão postal carioca. 

Há muito espaço para melhorar...

A prefeitura deveria estabelecer uma licitação a cada cinco ou dez anos para a exploração da árvore da Lagoa. As empresas que desejarem gozar desta peça de publicidade ofertariam um pacote de melhorias longevas à cidade, concentradas nos bairros próximos à Lagoa e com marcos anuais (que, se não cumpridos, implicariam na perda da concessão). O pacote de melhorias mais atraente determinaria a empresa vencedora. Alguns exemplos de obras que teriam grande serventia: reasfaltamento e expansão da ciclovia, construção de estacionamentos subterrâneos, revitalização e manutenção de canteiros, instalação de câmeras de segurança... E também a tal da despoluição da Lagoa, já falada e debatida há décadas, mas nunca concretizada.

A licitação por meio de benfeitorias evitaria a circulação de dinheiro, minimizando o risco de corrupção no processo. Além disso, os moradores do entorno da Lagoa - indiscutivelmente prejudicados nos meses do evento - teriam uma contrapartida poderosa. O evento deixaria de ser "pão e circo" e traria dividendos à cidade.

Caso a árvore de Natal acenda este ano, ela deveria se vestir de luto pelo ciclista que foi esfaqueado e morto na Lagoa e pelo nosso legislativo que insiste em proteger jovens bandidos.

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