Neymagem e semelhança



(Por: Mariano Andrade)

Desta vez, a seleção brasileira perdeu pros belgas, time conhecido como “diabos vermelhos”.

Caímos nas quartas-de-final com elegância, tanto em campo como no pós-jogo. O time tentou bravamente buscar o empate e teve suas chances, Tite deu uma entrevista ponderada após a eliminação e até Neymar nos poupou do “cai-cai” e das ridículas simulações que vinha encenando.

A ironia: o jogo com a Bélgica foi o único confronto onde nossa seleção não representou bem o Brasil...

**

Em meio a uma crise de representatividade que assola o cenário político nacional, a seleção brasileira – se deixava a desejar no futebol – vinha nos representando muito bem até o jogo com o México.

A comitiva brasileira culpou o VAR diversas vezes, mandou carta para a FIFA, reclamou da arbitragem e fez de tudo para atribuir aos outros a responsabilidade pelo mau futebol apresentado. Ganhamos da fraca Costa Rica no sufoco, só saindo do zero aos 45 minutos do segundo tempo... mas isso foi porque os adversários caçaram Neymar, porque o juiz se furtou a marcar um pênalti, etc. Excelente representação de como as pessoas se comportam no Brasil – tudo é culpa da crise, ou do capitalismo opressor, ou do Temer, ou da Dilma, ou da polícia, etc. Sugestão para a comissão técnica brasileira: atribuir a culpa da nossa eliminação à equipe do Japão, que deixou a Bélgica virar o jogo de oitavas-de-final no último minuto.

Acordar cedo, trabalhar e produzir não é nosso modus operandi preferido: se há algum ente para culpar ou no qual se encostar, um tanto melhor. É o império do mimimi. Muito diferente dos nossos ex-carrascos alemães, cujo técnico Joachim Low comentou o seguinte após sua eliminação na primeira fase: “jogamos mal e não merecíamos nos classificar”. Pergunta do milhão: qual país prospera mais, Brasil ou Alemanha?

Tite também vinha nos representando muito bem. Escalou o time pelo status dos jogadores, e não pelo mérito – em copa do mundo, deve jogar quem está melhor, pois é um torneio curto. Mas na “família Tite” prevaleceu o “quem indica” e Douglas Costa e Firmino foram preteridos em prol de Gabriel Jesus, perdido na copa. Tite escalou o astro merengue Marcelo, péssimo marcador, contra uma seleção belga fortíssima no contra-ataque – e tome 2º gol nas costas dele. Na própria convocação do grupo, Tite desprezou os bons jogadores que atuam no Brasil e que vinham se destacando na temporada, preferindo estrangeiros que jogam no “competitivo” futebol chinês – ainda somos tão colonizados assim?

Tite tentou dar discurso bonito com tom professoral, mas se enrolou nos substantivos coletivos. Confundir alcateia com matilha não é o pior dos pecados, mas Tite lembrou uma certa ex-presidenta que tentava usar palavras bonitas e produzia verdadeiras pérolas.

Nosso treinador implantou o inédito sistema de rodízio de capitães do time. Talvez o intuito tenha sido levar para a seleção algo parecido com um sistema de cotas. Afinal, aqueles jogadores que têm liderança e ascendência naturais sobre o grupo talvez tenham uma "dívida social" a pagar. Essa maluquice não funcionou em time de futebol, assim como não funciona em universidades, nem em matilhas e nem em alcateias.

Ainda no capítulo Tite, nosso técnico tentou blindar Neymar quando a imprensa internacional e os adversários reclamavam das repetidas simulações do jogador. Quando o técnico mexicano foi mais direto nas críticas – dizendo que Neymar era um mau exemplo para as crianças – Tite argumentou que “técnico fala com técnico, jogador fala com jogador”. É o foro privilegiado do futebol. Depois não reclamem do que rola em Brasília, ok?

Finalmente, Tite lembrou a todos que somos o país dos dois pesos e duas medidas. Refutou as críticas a Neymar, esquecendo-se de que ele mesmo, enquanto técnico do Corínthians, havia dado uma entrevista contundente acusando Neymar de mau comportamento esportivo por repetidas simulações. Na ocasião, Tite também pontuou que a atitude de Neymar era um mau exemplo para as crianças, pois tentava obter vantagens indevidas ludibriando a arbitragem.

A mudança de posição de Tite lembra, por exemplo, Gilmar Mendes – o lamentável ministro do STF que em seus livros defende a prisão em segunda instância mas muda de ideia quando está julgando um compadre ou um político. Será que Tite também acha que Neymar não é um “homem comum” e está acima da lei, linha de argumentação obtusa e carcomida defendida por Lula?

**

O que dizer de Neymar? Certamente ele tem um talento ímpar, que poderia alçá-lo à condição de ícone eterno do esporte brasileiro, como Pelé, Ayrton Senna, Bernardinho, Oscar Schmidt e outros. Mas Neymar não potencializa esse dom, pois escolhe atuar de forma individual em um esporte coletivo.

Neymar tem um comportamento abominável. Quer sempre ser o centro das atenções, seja na bola ou nos penteados. Exagera nas jogadas individuais. Troca de time visando objetivos estritamente pessoais (a bola de ouro, por exemplo), mas esquece que são consequência de fazer parte de um coletivo excelente. Neymar descarta equipe, companheiros e fãs quando o curtoprazismo convém. Não se trata de gestão de carreira e sim de narcisismo. .

Apesar da atuação digna na partida contra a Bélgica, a lembrança que nossa seleção de 2018 deixa pro mundo é o “cai-cai” de Neymar. Já virou chacota nas redes sociais e na imprensa internacional. As simulações estrebuchantes do jogador constituem um péssimo exemplo – tentar levar vantagem enganando e subtraindo dos outros. Pior: mau exemplo vestindo a camisa do país.

Por que a revolta da imprensa internacional com o teatro de Neymar? Porque, como bem disse Tite na entrevista de 2012, ganhar ou perder é parte do jogo. Mas levar vantagem indevida é ilícito, mau exemplo, reprovável. O adversário também treinou, ralou, mereceu estar naquela partida – investiu tempo, e tempo é dinheiro. Portanto, simular um pênalti para ludribriar o juiz é tão vergonhoso quanto assaltar a Petrobrás: prejudica outrém, alguém paga a conta. Mas, infelizmente, os brasileiros não conseguem fazer esta conexão, preferem se achar monopolistas das virtudes e do bom futebol e menosprezar a opinião alheia. Venezuela idem.

Neymar representa o que há de pior no Brasil, é a imagem e semelhança do jeitinho brasileiro, da abominável Lei de Gérson, do individual querendo superar o coletivo, das oportunidades perdidas e do crescimento mediocremente abaixo do potencial. Como diz uma frase (perfeita) que viralizou nas redes sociais, “o Brasil é um monte de gente querendo se dar bem sozinha e se ferrando junta”. Neymar personifica exatamente isso. Arrastou sua equipe junto com ele.



Tite sabia disso quando deu a entrevista de 2012. Renê Simões idem: criticou Neymar em 2010, profetizando que estávamos criando um monstro e que o único remédio seria a educação. Nem Neymar e nem o Brasil receberam a educação necessária, e hoje temos um monstrinho em campo e monstros de 15 anos portando fuzis e estuprando mulheres em nossas cidades.

**

Perdemos para os diabos vermelhos. Nada mais adequado, uma vez que o povo de bem do Brasil também foi alvejado pelos demônios vemelhos do PT e suas corjas.

Comments