Os segredos de Victoria


(Por: Mariano Andrade)

A comédia “Crazy People” de 1990 trazia Dudley Moore como um publicitário já farto das propagandas politicamente corretas. Ele passa então a adotar a estratégia de – pasmem – falar a verdade! Com isso, bola slogans honestos e diretos para seus clientes, alguns deles hilários.




O diretor da agência manda o publicitário se tratar num hospício, mas na sua ausência as propagandas acabam sendo veiculadas por engano... e fazem um sucesso danado!

**

Será que o mundo já era tão chato em 1990 para inspirar esse enredo? Talvez sim, mas certamente só piorou nestes últimos 30 anos. Algumas das propagandas fictícias que aparecem no filme seriam consideradas hoje em dia bullying, ódio, fobia, fascismo, nazismo, mimimi, mimimi, mimimi. “Stop pretending, if you look like this, you’re fat” era a campanha criada para um programa de dietas. Imaginem o rebuliço hoje em dia... 


Não precisa nem imaginar. Recentemente, a Victoria’s Secret, marca americana de produtos femininos como perfumes, peças de lingerie e outros, cancelou seu desfile anual de 2019. É verdade que o evento vinha perdendo audiência na TV, assim como qualquer outro conteúdo que pode ser consumido online a qualquer tempo. Também é verdade que as vendas da empresa vêm caindo, bem como suas ações. No entanto, um vetor importante para o cancelamento dos eventos foi a polêmica sobre o elenco de modelos da Victoria’s Secret, com diversos influencers postulando que só valorizava mulheres bonitas e de corpos esculturais.

Esses influencers de meia-tigela deveriam ler e reler o livro Influence (não é trocadilho) de Robert Cialdini. O autor parametriza as ferramentas de persuasão em seis verticais, sendo uma delas o que ele denomina “liking”. Quando você vai comprar um carro e o vendedor pergunta algo pessoal, por exemplo qual sua cidade natal, ele sempre encontra um ângulo para se relacionar à resposta... “meu primo também nasceu lá”. A técnica de venda de tentar estabelecer uma conexão aumenta a probabilidade de a venda ser concretizada, e é o que Cialdini denomina “liking”.

Usar vendedoras (ou vendedores!) atraentes é uma outra ferramenta do “liking”. No fim das contas somos animais e nosso DNA é programado para termos mais propensão a nos engajarmos numa transação com uma pessoa bonita. Da mesma forma que ninguém sente vontade de entrar num restaurante mal decorado e de fachada feia, o mesmo funciona para as pessoas com quem transacionamos.

Portanto, nada mais natural do que a Victoria’s Secret usar modelos lindas e esculturais para apresentar seus produtos. O mimimi de que a empresa deveria ter uma diversidade de modelos (plus size, trans, etc) é uma balela danada. A empresa escolheu uma estratégia e pode muito bem não querer atacar esse mercado. Se a estratégia estiver incorreta, a companhia vai sofrer, mas não é necessária uma patrulha social sobre isso. Trata-se de uma empresa privada com ações em bolsa, quem estiver insatisfeito que venda suas ações e não compre seus produtos.

Que gente doida!

**

No filme, Dudley Moore é enviado para um hospício. Faz amizade com os demais pacientes, explica o porquê de ter ido parar ali e monta uma agência de publicidade lá dentro com todos ajudando na criação. E a empreitada acaba fazendo um sucesso danado. A propaganda que os malucos bolam para a Porsche é absolutamente sexista, mas ultimamente genial. Vale conferir.




Felizmente, algumas empresas parecem não subscrever à linha politicamente correta. As duas fotos abaixo foram tiradas na Europa há poucos meses e mostram que nem tudo está perdido. "Maximise your assets" é muito bem-vinda, afinal qual mulher gostaria de comprar um sutiã que não valorizasse seus seios, ou seus “ativos” como diz a etiqueta? O comercial da Ford, por sua vez, diz “descubra nossos modelos sexy” – e fato é que a maiorias dos passantes, homens e mulheres, olhavam para a imagem. 




**

Algumas “Victorias” já compartilharam alguns segredos sobre os quais os chatos de plantão deveriam refletir um pouco.

Segundo Victoria Beckham, ex-Spice Girl e símbolo sexual na Inglaterra, “it’s not healthy to be jealous”. E ela vai mais além: “I think the sexiest thing about a woman is confidence”. Portanto, para as mulheres que não têm corpos perfeitos de Victoria’s Angels – ou seja, 99.9% da população feminina – a boa notícia é que há outras armas tão ou mais eficazes à disposição, mas não o mimimi.

Outra Victoria, a rainha da Inglaterra por mais de 60 anos, arrebata o tema: “Great events make me quiet and calm; it is only trifles that irritate my nerves”. Grandes eventos nos acalmam, enquanto as ninharias irritam.

Pena que as ninharias se sobrepujaram ao grande evento.

**

Quem sabe, na mesma onda, os comerciais de cremes dentais mostrarão pessoas com dentes podres daqui a alguns anos?



Comments